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Café com o Sensei

Pensamentos e comentários do Sensei Jorge Kishikawa




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    30-jan-2008

    Fogos de Artifício e Tameshigiri

    Não é de hoje que falo que não se deve brincar com fogos de artifício. 
    Na época em que dava plantões no Natal e Ano Novo era só dar meia noite que depois de 2 minutos já chegavam os pacientes com as mãos e braços todos arrebentados com os fogos de artifício. 
    Não menos perigosa é a prática do tameshigiri*, quando feita por elementos que mal conseguem entender a importância da katana como objeto de combate e muito menos o significado de seu espírito. 
    Há também pseudo professores que incentivam esta prática a fim de angariar alunos, por não possuírem outros conhecimentos. Ao contrário do Niten, no qual somente os mais graduados podem experimentar, estes pseudo professores, irresponsáveis por sinal, indicam aos seus alunos, lâminas baratas (e perigosas pela má fabricação) já nos primeiros dias, quando estes mal conseguem desembainhar a espada. 
    Impressionam os espectadores só por estarem cortando algo com uma espada. E, é claro, existem tolos para este tipo de atividade. 
    Não. Não se deixe enganar. 
    Tameshigiri é coisa séria. 
    Não é fogos de artificio.


    *tameshigiri = tameshi (testar)+ giri (corte) 
    prática de cortar objetos com espada com lâmina

    29-jan-2008

    Shinbo

    Você já pode ir embora, 
    ou 
    Amanhã não haverá treino (quando na verdade haverá), 
    ou de forma mais direta: 
    Este treino não é para você 
    são frases que podem ser ouvidas nos dojos* tradicionais de kobudô* no Japão. 
    Se você não for convidado para participar, não entra. 

    São treinos onde somente os mais veteranos têm acesso a katas, armas e detalhes diferentes.
    Acho que isto responde o comentário feito por um visitante que, ao assistir um dos treinamentos no Niten observou que os exercícios eram praticamente idênticos aos de kendo. 
    Recomendo um pouco de shinbo* nesta viagem, meu caro...


    kanji shinbo = paciência

    *dojo = local de treinamento 

    *kobudô = artes dos samurais antigas 

    *shinbo = paciência

    28-jan-2008

    Café com açúcar

    Neste final de semana quebrei algumas regras:
    Estive em Ribeirão Preto, berço da comunidade japonesa no Brasil, onde foram os nosso primeiros imigrantes. Até então, sempre havia ido de avião, num pulo. 
    Desta vez fui de carro. Estrada. Era chão que não acaba mais. Reta. Foi bom porque percebi o quanto devem ter sofrido os primeiros japoneses, pegando a ferrovia que os levaria às terras do café. Sem conseguir falar uma palavra, em terras totalmente desconhecidas, num futuro incerto, num trabalho incerto. Foi o começo de toda a imigração.

    Ribeirão Preto é também conhecida por ser a terra do café. E não é só no nome, não.
    Tive a oportunidade de tomar um cafezinho, que você nem imagina ...
    Só que desta vez, foi com açúcar. 
    Do contrário, teria sido um sacrilégio...

    24-jan-2008

    Flechas, não!

    Imagine-se empunhando uma espada e executando um movimento. 
    Pode ser de bambu, a shinai, e acertando o men, a proteção da cabeça do oponente. 
    Qual é a primeira imagem que lhe vem a cabeça? 
    Segurando com as duas mãos, não é isso? 
    Pois saiba que, nos combates de kenjutsu, tal como acontecia antigamente, existem maneiras de se segurar na lâmina e a partir daí realizar os golpes. 
    - Espere aí, mas se eu segurar a lâmina eu não vou cortar a minha mão? - seria a sua dúvida. 
    - Certamente, se você não segurá-la adequadamente - eu diria . 
    Colar as mãos na espada e não soltá-la é um grande erro estratégico, bem como disparar flechas quando o inimigo já invadiu o castelo...

    23-jan-2008

    Kiriage

    Seria de se supor que o mais óbvio ao tomar uma espada na mão, levantamos os braços ao alto e descemos até atingir o alvo. Ou seja, ou Kirisage*. 
    Ao adotarmos uma postura com a lâmina abaixo da horizontal ou mesmo na altura da garganta do oponente, o óbvio se torna o oposto. Ou seja. cortar de baixo para cima. Kiriage*. 
    Os alvos pretendidos costumam ser os bracos e os flancos do oponente, acarretando no que chamamos de utigote*. Golpes no utigote, mesmo que superficias, eram fatais, pois é onde percorrem as principais artérias como a radial e a ulnar. Estas se localizam em uma posição relativamente superficial nos antebraços. 
    Em combate de kenjutsu, amplia-se assim a possibilidade de desestruturar o oponente. 
    O oponente fica em dúvida, se o ataque será pela Montanha ou pelo Mar. 
    Aumenta-se assim a percepção em relação à origem dos ataques. 
    E é claro, o conhecimento na estratégia. 


    kirisage = cortar para baixo 
    kiriage = cortar para cima 
    utigote = parte interna do braço; em medicina dizemos, parte anterior do antebraç

    21-jan-2008

    Ainda Hoje

    Incrível. 
    Uma amiga me dizia que não era para falar nem imaginar coisas negativas que se não atrai este tipo de energia e daí acontece o que você falou ou imaginou. 
    Ontem, estava eu num parque de diversões, quando fui abordado por uma menina de 8 anos. Loirinha, bem vestida, bem articulada e ao que tudo parece, de boa família. 
    - Você é da turma do Chingling*??? - perguntou-me ela enquanto puxou os olhos para as laterais fazendo a expressão que me fizeram há mais de 30 anos: aquela do olho puxado, do olho rasgado. 
    Sorri e disse que não, para ela. Minutos depois, para minha surpresa, fez a mesma pergunta ao meu filho, o que, pelo que percebi, deixou-o meio magoado. 
    Preconceito? Inocência? Falta de educação dos pais? Não sei. 
    Estamos comemorando o Centenário e ainda brincadeiras de mal gosto perduram após gerações. 
    Deixemos para lá. De qualquer maneira, o que a minha amiga me disse parece ser verdade..


    Ching-Ling, personagem do Sítio do Pica Pau Amarelo,
    interpretado pelo ator Anderson Lau

    *Ching Ling = pelo que eu ouvi é um personagem chinês do Sítio do Pica Pau Amarelo.

    21-jan-2008

    Grande e Pequeno

    Falamos já sobre os golpes curtos.
    Para explicar melhor, dividimos as técnicas de corte no kenjutsu (com bogu*) em oshigiri* e hikigiri*.
    Quando se levanta os braços (golpes amplos) para depois golpear, os cortes representam a forma hikigiri de corte. Já os golpes curtos, representam a forma oshigiri de corte.
    Isto pode ser bem evidenciado se usarmos a naginata de combate*, pois a curvatura na lâmina faz com que posssamos aplicar tanto o oshigiri como o hikigiri. 
    Se um dia as espadas de bambu tiverem curvatura (pois atualmente são retas), este conceito será bem compreendido.
    De qualquer maneira, entenda que em tudo existe os opostos: o Sol e a Lua, o Yin e o Yang, o grande e o pequeno.


    luta com naginata de combate

    *bogu = equipamento de proteção
    *oshigiri = corte empurrando-se os braços a frente
    *hikigiri = corte puxando-se os braços
    *naginata de combate = cabo de madeira com bambu na ponta

    18-jan-2008

    Ilustração

    n. e.: o Sensei acrescentou ilustrações aos Cafés dos dias 17 e 16, dê uma olhada.

    17-jan-2008

    Não sou Japonês

    Falo mais uma sobre a história da imigração japonesa no Brasil.

    Lembro-me que até mesmo na minha adolescência (estou falando do início dos anos 80), aqui na capital, descendentes de japoneses da minha geração repudiavam o que eu fazia. Vestiam jeans e camiseta, cabelos compridos, adoravam motos e brilhantina à la John Travolta. Queriam era ter uma menina na garupa e estar longe de aprender o japonês. Tinham vergonha de serem descendentes de japoneses, cujas causas, não me seria possível de colocar num espaço curto do Café, mas deixemos para outro dia qualquer para falar deste assunto ( # - Kuden )
    Cochichavam entre eles algo do tipo:
    - Olha aí estes irmãos bregas fazendo estas coisas dos velhos.
    Lembro-me que enquanto a maior parte dos jovens kendocas se concentrava no interior e nas colônias, aqui na capital eu era um dos poucos jovens, pertencente aos 5% do total. O resto, era, de fato, o pessoal mais velho, cuja idade superava a dos meus pais.
    Quer queira, quer não, jovens da minha geração, que cresceram na capital, deixaram de seguir a sua cultura, sua língua e suas origens, criando-se assim um grande vácuo na história da imigração japonesa do Brasil.
    Sei que não adianta lamentar o passado, mas, pelo que tenho ouvido, hoje estão arrependidos...

    16-jan-2008

    Olho Rasgado

    Há 100 anos, chegaram os primeiros japoneses no navio Kasato maru, desembarcando no porto de Santos. 
    Daquela época até os dias de hoje, muita história para contar.
    Nestes dias, enquanto dava entrevista a um jornal, apesar de não pertencer às primeiras gerações dos primeiros que chegaram aqui, lembrei-me de uma que compartilho com você. 
    Meu pai, recém formado em engenharia no Japão, veio a trabalho numa multinacional americana aqui no Brasil. Nos tempos em que era moleque, quando tinha os meus 7 e poucos anos morávamos na Grande São Paulo e vivia, por um lado, entre colegas brasileiros e, por outro, descendentes de japoneses. Meus primeiros colegas foram brasileiros. E eram amigos do peito. 
    Mesmo assim, naquela época (estou falando dos anos 70) sofri preconceito. Provocavam-me com adjetivos pejorativos como japonês de olho rasgado e outros. Faziam gozações imitando um japonês e por aí vai. Só faltavam jogar pedra. Isto foi até o final dos anos 80.

    Não guardo mágoas deste período, e fico contente duplamente. 
    Primeiro, ao ver que, hoje, apás 100 anos, o Brasil recebe de braços abertos a comunidade do Sol Nascente. Basta ver a TV, abrir um jornal. Centenário. É o assunto do dia. 
    Em segundo, apesar de não ser das mais agradáveis de se contar, por ter vivido e sentido na pele um pouco do que os pioneiros passaram nesta terra para chegarmos até o que somos hoje. 
    Todo descendente de japonês, deve ao menos tentar compreender o que é, de fato, 100 anos.
    100 anos de luta.


    sabetsu = preconceito




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