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Recebi o email desta aluna ainda no final do domingo:
O Sexto Torneio Brasileiro por Equipes de Kobudô, realizado em Ibiúna, foi muito proveitoso para todos.
Antes de falar sobre ele, gostaria de relembrar as palavras do Sensei na carta de felicitações de Ano Novo:
"O ano de 2007 é o ano do INOSHISHI, o javali (...). Quando vê sua presa, parte para acertá-la com tudo, em linha reta, sem se importar com os lados. Que tenhamos 2007 como um ano repleto de golpes certeiros. Sem hesitação, dúvida ou arrependimento. 2007... treinar como nunca. Para adquirirmos a coragem do guerreiro e a obstinação do INOSHISHI."
Ao ler a carta, após o torneio, senti que de fato o espírito do inoshishi esteve presente em todos que organizaram, colaboraram e participaram do evento.
Foi um torneio e foi um gashuku. Acordar cedo, limpar os banheiros, limparo dojo, limpar os refeitórios, treinar, treinar e treinar, além decompetir.
Durante quase trës dias todos se esforçaram e fizeram do torneio um belo aprendizado, com inúmeros momentos de ouro.
No terceiro, e último dia, tivemos o Seminário de Niten Ichi Ryu, igualmente proveitoso. Um privilégio para os que compareceram - poder ter o Sensei para explicar e ensinar mais ainda sobre o estilo deixado por Musashi-sensei.
Mais que um torneio, foi um aprendizado sobre servir, ser útil.
Estar ao lado do Sensei para ouvir, aprender e aplicar o Bushido no dia-a-dia é uma honra. Aos que não foram, apenas digo que perderam momentos importantes.
Domo arigato gozaimasu Sensei por nos guiar no Caminho!!!
Domo arigato gozaimashita à todos que fizeram o torneio acontecer!!
Para aqueles inoshishi que acertaram golpes certeiros, omedeto.
Àqueles que ainda não conseguiram, ainda temos novembro e dezembro.
Estes 3 dias do 6o Torneio Brasileiro de Kobudô ficarão para sempre.
Foram dias agitados, com muita adrenalina e emoção.
Por parte dos atletas e por parte da organização.
Só agora deu para dar uma pausa para o cafezinho, uma respirada e lembrar do que aconteceu.
Foram momentos novos, situações imprevisíveis e cenários diferentes que ficarão na lembrança de todos:
o tameshigiri* ao ar livre com toda a familia Niten reunida;
os novos shoden* do Niten Ichi Ryu Kenjutsu e seus katas de demonstração;
o espírito de iniciante e a união de todos nos Osoji*;
o cimento, o telhado velho, campo, lagos e terra;
a festa de confraternização lá no casebre da roça com os talentosos samurais do Niten;
a provocação de arruaceiros da região, que prontamente foi resolvido e de forma civilizada pelos nossos organizadores;
no Kobudô, o shoto, naginata e nito, o tachi;
no Jojutsu o desempate histórico dado pelo público;
o big seminário do Niten Ichi Ryu com o ginásio cheio, o que me deixou até "estressado"*;
o treino que fiz com todas as crianças e constatar a alegria estampada no rosto de cada uma delas;
a satisfação por parte de todos os pais;
enfim, um Dia da Criança e final de semana inesquecível em que todos puderam levar o seu presente:
Um significado para as nossas Vidas!
*tameshigiri = treino de corte com espada com fio
*shoden = graduação que confere o recebimento do makimono (documento em forma de pergaminho e que na época dos samurais eram o atestado de evolução técnica) do estilo
*osoji = limpeza do local, que nos dojos tradicionais do Japão, é feito por todos os participantes e teve origem com os monges budistas
*"estressado" = estressado no bom sentido, pois na verdade foi uma alegria ver tanta gente treinando quase que em cima das arquibancadas por falta de espaço.
Musashi sensei e os mestres no Japão devem ter ficado contentes
Hoje darei uma pausa em relação a matéria que ficamos de conversar, da Kendo Nippon, por se tratar de um dia, para nós do Instituto Niten, muito especial.
A brisa matinal de outono se fazia sentir na inóspita região de Kumamoto... Fazia uns 16 graus. Um pouco frio para estar so de kimono* e hakama*. Mas sem muita chuva, furacão, enfim, ótimo para apreciar a natureza. Ar puro nas montanhas e silêncio.
Com passos, nem tanto firmes, segue o trajeto íngreme em direção ao topo da montanha.
Pincel, papel e é claro, a espada a mão.
Senta. Respira e reflete sobre a sua vida. Como diria em um dos seus trechos:
"Percebi que as minhas vitórias sobre os meus adversários não decorreram de minha alta capacidade técnica. Provalvelmente pelo fato de meus adversários serem fracos." Estava frustrado...
-Yoshi! - deve ter pronunciado, mesmo frustrado, começou então a colocar no papel o que viria a ser o tratado de estratégia mais famoso no arquipélago japonês: o Livro dos Cinco Anéis (ou Go Rin no Sho, em japonês). Isto tudo, não por sua vontade. Mas a mando de seu senhor, Hossokawa Tadatoshi, daimyo* do então castelo de Kumamoto.
Hoje é um dia inesquecível para todos nós do Instituto Niten.
Uma pausa, em respeito ao nosso mestre, Miyamoto Musashi sensei, por ter nos deixado, mesmo que a contragosto, o Livro dos Cinco Anéis.
Na foto da 2a página da matéria Kendo Nippon, vemos o 12o sucessor do Niten Ichi Ryu ( Miyamoto Musashi sensei, o criador do Niten Ichi Ryu ), Yoshimoti Kiyoshi sensei e o seu parceiro e mestre Ishii Toyozumi.
Eles estão demonstrando o Nito Seiho do Niten Ichi ryu no evento mais cobiçado por todos os mestres de kendo e dos praticantes de kobudô: o Kyoto Taikai.
Ao participarem deste evento, que é dividido em categorias 6o, 7o e 8o dan de kendo, demonstram que, tal como uma agulha no palheiro, foram reconhecidos por sua habilidade técnica no Japão. Demonstrações de kobudô feitas pelos mestres de cada estilo são feitas intercaladas entres as lutas de kendo.
Este evento foi realizado em maio deste ano e só tende a confirmar o que sempre digo:
— No budô*, e acredito que em outros caminhos não é diferente, existem 2 tipos de praticantes: aqueles que buscam a Verdade e aqueles que buscam títulos. No final, o mundo reconhecerá o que for o Verdadeiro.
É com orgulho e satisfação que repasso a você a revista Kendo Nippon do mês passado.
O nosso mestre Gosho Motoharu sensei e seu filho, Yoshimoti sensei foram entrevistados em matéria especial, em razão da dedicação à arte da espada durante décadas. Bem, na verdade, isto denota o reconhecimento por parte de toda a comunidade que congrega os praticantes de espada, como sendo o 12osucessor do Niten Ichi ryu, o Sensei Yoshimoti Kiyoshi.
É a revista de maior circulação no Japão e no mundo, lida por mestres, sokes, técnicos, alunos, estrangeiros, praticantes e atletas.
Vamos falar sobre esta matéria aos poucos, enquanto tomamos o nosso cafezinho de todos os dias?
Veja :
Jisa boke. É pelo que estou passando. Jisa, ou seja, a diferença de fuso horário entre as várias regiões do mundo. Boke, siginificando levemente afetado, ligeiramente distante.
Demora alguns dias para se normalizar, no caso de uma viagem do Japão para o Brasil. É uma sensação de estar, mas não estar, ver, mas não ver, ouvir e não ouvir, sentir, e não sentir.
Mas, nem sempre é preciso estar com o jisa boke para estar distante.
O Jiga boke, palavra de minha autoria, é mais frequente.
Estão, mas não estão presentes. Vêem, mas não enxergam. Ouvem, mas não compreendem. Sentem, mas não captam.
Jiga: ego, o eu.
Jiga boke: aquele que nunca sintoniza a conversa com os outros. Você fala uma coisa, ele responde outra. E só fala nele.
Chatos para conversar.
jigaboke
Acabei de chegar das nuvens e apesar de estar em terra, a cabeça ainda não estava.
Devo confessar que tenho sempre um ritual a cumprir quando chego em Cumbica.
Pego as malas na esteira, coloco-as no carrinho e saio no saguão do aeroporto.
Desta vez, um aluno antigo veio me buscar. Assim que me viu, veio correndo e apanhou o carrinho.
- Foi tudo bem na viagem, Sensei? - a mesma pergunta.
- Foi, mas ainda estou meio zonzo - a mesma resposta.
Esfrego os olhos e tento ver o que se passa, pois ficar quase 40 horas acordado não é brincadeira. (eu não sou de dormir no avião).
- O de sempre, Sensei? - a mesma pergunta.
- É claro! - a mesma resposta.
Vamos ao balcão da lanchonete que aqueles que já estiveram em Cumbica devem conhecer.
- Dois expressos por favor! - era o aluno cumprindo o seu papel.
- Este nosso cafezinho, é... DEMAIS!!! - era eu fechando o meu ritual.
E não é que o caçula ( 28 se setembro - Quero Mais! ), que mal falava comigo, hoje já veio me procurar lá pela manhã para fazer o treinamento?
Hoje já estava falando comigo, me acompanhando até a saída, e me ajudando quando precisava.
Sempre alegre e ansioso para saber quando eu iria embora e se eu vou ensinar mais algumas técnicas enquanto estiver na pousada. Já deixou a sua shinai* bem do lado da mesa em que eu costumo tomar o meu breakfast.
Acho que terei que ensinar alguma técnica.
É prazeroso ver o kenjutsu abrir o coração do tibi*.
*tibi = forma popular de chamar meninos. Algo como "garoto", "moleque".
O filho caçula do dono da pousada em que estou também começou kendo. Tem 7 anos.
Enquanto eu tomava o meu café (que está longe de ser o nosso, pois é muito aguado), chamei-o para ver como andava o treinamento. E ele, por ser tímido e desconfiado, no início ficou receoso em aceitar. Falei para fazer alguns suburi e ok, foi aprovado.
Pedi que trouxesse então 2 shinai* do irmão mais velho. Ele não entendeu direito, mas foi lá e trouxe. O irmão mais velho também, que deve ter seus 16 anos.
Disse a eles que iria ensinar alguns golpes novos. Segurei uma em cada mão em gedan e pedi ao caçula que esboçasse um ataque frontal no men*. Na hora que ele levantou o braço já tinha percebido que fora vencido, pois minha shinai já estava no seu uchigote* ( 23 de maio - Uchigote ) e o espanto se misturou com alegria.
- Quero mais, quero mais! - gritavam.
Ensinei mais alguns golpes e eles falaram que iriam aplicar lá na escola e que agora iriam conseguir vencer o campeonato regional.
Foi dificil, mas tive de convencer em não usar as técnicas, pois se tratava de segredo do kenjutsu.
Vamos deixar assim...
Em inúmeras situações, gaijin*, por desconhecerem os katas do bushido, cometem erros gravíssimos no Japão. Interpretam de forma errônea um elogio, uma crítica, um conselho.
Um exemplo do Bushido:
"Quando um samurai se considera extraordinário por ter prestado algum tipo de serviço especial ao seu senhor, mesmo que outras pessoas pensem de igual maneira, deve ponderar que seu próprio senhor pode não pensar do mesmo modo"
Pensar que prestou um ato heróico e deslumbrante pode se tornar repugnante e decepcionante.