Carina é Aluna do Niten em Ribeirão Preto.
No livro Natrilhas Carina conta sobre percorrer O Caminho:
"Quero compartilhar processos, histórias, projetos, viagens, sugestões, pensamentos, questionamentos… Enfim, gerar movimento em prol de mudanças positivas minhas, do outro e do mundo."
No Último Cápitulo de Natrilhas
Carina escreve sobre a vinda ao Gashuku em São Paulo.
Leia abaixo:
"São Paulo
200º dia na estrada
"Quando a fraqueza bater, a preguiça segurá-lo ou a tentação lhe chamar,
lembre-se do seu objetivo maior dos benefícios de estar no Dojo"
Sensei Jorge Kishikawa
Saímos de carro de Ribeirão Preto no sábado, às 3 horas da manhã, rumo a São Paulo, para participar do meu primeiro treino intensivo de Kenjutsu.
Havia dormido pouco de sexta para sábado, e dirigir por três horas na madrugada acabou sendo cansativo. No entanto, mesmo com o sono insistindo em passar sobre minhas pálpebras, ao chegarmos no dojo, ás 06h30 da manhã meu espírito estava desperto. Sentia um aquecimento no corpo, bem na região abaixo do esterno, no nosso centro de energia, no Ki. Não era ansiedade ou inquietação, era minha energia que me colocava em prontidão.
O dojo fica em um bairro tranquilo de São Paulo, o que me parece raro em uma cidade gigantesca como esta, mas o silêncio existia e dava outro tom ao passar portão adentro. Ao chegar, começamos ajudar em algumas tarefas, e o treino começou às 9 horas.
Treinei como se fosse meu último treino na vida. Aliás, desde que voltei ao Brasil, é assim que tenho me comportado, como se não houvesse duvidas sobre o que deve ser feito, e o que deve ser feito; treinar, meditar e manter alinhada... Agora. As outras atividades vão se encaixando quando este caminho esta sendo trilhado.
Não que seja fácil, mas simplesmente não há como não fazer, principalmente quando se segue praticando.
O primeiro dia passou voando e após cerca de 9 horas de treino, com intervalo para almoço e jantar, dormimos. Por mais que a noite de descanso tenha sido muito boa, acordei com a sensação de que havia sido curta . As 6h30 do domingo, demos novamente inicio às atividades. Como não pratico as modalidades que estavam sendo aplicadas pela manhã, fui trabalhar com a equipe que estava enrolando os Tameshis - um tipo de esteira de palha umedecida que, enrolada, é utilizada na prática do Hiden Tameshiguiri, o treino de corte com a Katana real.
Aprendi que enrolar o Tameshi é dar o melhor de si em cada movimento. Não se pode deixar espaços entre as dobras, pois isso dificulta o corte. Sendo assim, deve-se tensionar todo o tempo o material enquanto enrola. O cheiro não é agradável, uma mistura de chá podre com produtos químicos, impregnando a mão e o kimono por um bom tempo. No entanto, por mais que não fosse utilizar pessoalmente nenhum desses materiais, já que decidira que ainda não estava pronta para segurar uma espada com uma lâmina real, estava muito feliz por estar ali, sendo útil.
Lembrei-me do SAMU no Templo Budista na Argentina e pensei se fora aquela experiência que me fazia hoje agir assim ou se a experiência por aqui que me conduzia para essa atitude. Passado, presente e futuro se diluíam.
Enrolamos mais de cem peças e, quando a tarefa acabou, fui presenteada com uma. Agradeci, sem questionar, e fui realizar outra tarefa até chegar meu momento de treinar o corte. Minhas mãos - que ainda nem seguravam o Shiken, espada com corte real - já começaram a suar.
Observei os alunos coordenadores praticando. Seguravam a Shinken com respeito e muita concentração. Samurais . O dojo estava silencioso escutava somente o som dos Tameshis ao serem atingidos e alguns murmúrios.
Quando chegou a minha vez, eu estava nervosa, as mãos suavam intensamente e o medo de fazer alguma coisa que machucasse alguém, mesmo as pessoas estando a uma distância segura, pulsava em mim. Segurei a espada instantaneamente percebi que nem de longe o treino do olhar me traria essa mesma forte sensação que vivenciei ao experimentar o peso e o equilíbrio da Shinken. Senti um imensurável respeito ascendente, uma consciência do autêntico poder dela e compreendi a carga histórica de toda uma arte marcial milenar.
Recebi as orientações dos coordenador responsável e apliquei o primeiro corte. A espada parou no meio do Tameshi. Voltei a posição inicial e escutei com mais atenção e ênfase sobre como proceder. Pisquei lentamente, as mãos ainda tremiam. Respirei fundo e me transportei para outro lugar, onde me encontrava sozinha e em profundo silêncio. Olhava para a peça na frente e o vazio ao redor. As mãos pararam de tremer. Abri os olhos. Apliquei o corte. Implacável, a espada dividiu a peça em dois pedaços. Assustei-me. Desconectei.
Recebi mais uma orientação para arriscar outro corte de uma nova posição, porém quando o fiz, este também parou no meio da peça. Escutei um breve feedback do coordenador e entreguei com cuidado e reverência a espada para o próximo aluno. Caminhei em direção à saída do dojo e só alguns segundo depois voltei a respirar normalmente.
Nesse momento, a compreensão da importância desse rápidos segundos passava em câmera lenta por mim. Olhei ao redor e percebi que até ali eu compreendia muito pouco da arte marcial que praticava, executava golpes superficiais. Porém, acabara de despertar para o precioso e infinito sentido da arte Samurai, do caminho da espada.
Sai do treino intensivo sentindo ainda mais forte a clareza que se deve seguir, nos treinos e na vida. Afinal o caminho se revela ao caminhar. "
Tiemi - CuritibaCarina! Doumo arigatou gozaimashita por compartilhar seu relato conosco.
Seja qual for a `trilha` que você seguirá daqui pra frente, rogo para que continue tendo esse espírito vibrante e alegre.
Omedetou gozaimasu!
Carbonete - Rio de JaneiroCarina , Arigato Gozaimashita, por compartilhar seu sentimento sua emoção conosco, de forma a nos emocionar também.
Breno - NiteróiIncrível, Carina! Lembrou-me da primeira vez que fiz o Tameshigiri. Tive sensações muito parecidas com as que você teve. Omedetou!
Breno Cesar - Santo AndréOmedeto gozaimasu senpai Carina !